Filme de Robert Guédiguian estreia nesta qinta-feira (28/4) no Cinema do Museu
Robert Guédiguian, um dos mais prolíficos cineastas franceses da atualidade, talvez tenha feito com Uma História de Loucura, em cartaz a partir desta quinta-feira (28/4), no Cinema do Museu, seu filme mais pessoal. Se não pessoal, no sentido de íntimo, pelo menos aquele em que, de fato, parece sintetizar uma necessidade histórica e identitária que ele há muito persegue.
Para aqueles que acompanham sua vasta obra – já dirigiu 19 longas –, ele é reconhecido como o cineasta de Marselha, a cidade portuária em que nasceu, há 62 anos, e onde sempre tece suas ficções calorosas e amorosas. Em Uma História de Loucura, Guédiguian mais uma vez escava as memórias de seus antepassados. Filho de pai armênio e mãe alemã, ele é um dos milhares de descendentes que nasceram e viveram sob a sombra do genocídio que seu povo sofreu há exatos 101 anos pelas mãos dos turcos.
Foi para novamente reabrir a ferida do genocídio armênio, em que 1,5 milhão de cidadãos foram mortos, nos anos em que corria a Primeira Guerra Mundial, que Guédiguian erigiu esse grandioso afresco sobre as tentativas de seu povo em se vingar dos turcos e também exigir do governo da Turquia o reconhecimento pelo crime. Para o cineasta, é como se o mundo fizesse vista grossa sobre este vazio que os armênios carregam.
Mas como politizar essa dor sem parecer que está jogando álcool na fogueira dos atentados que tem atingido a França? Andando numa linha tênue, como a equilibrar-se no fio da navalha, Guédiguian revisita fatos sangrentos da história em que os armênios pegaram em armas, ao mesmo tempo em que contrapõe, por meio de um inocente – pego no meio dessa violência, mas que nada tem a ver com ela –, um olhar que permite sair do terreno da vingança para o entendimento humano de uma dor que nunca parece ter fim.
Uma História de Loucura conta duas histórias em que os armênios se viram impelidos a buscar esse confronto com o passado por meio da violência. São dois movimentos bem distintos, separados por duas gerações, cerca de 60 anos, que mostram que os jovens estão sempre propensos à luta. Na primeira parte, que dura cerca de um terço do filme, Guédiguian acompanha o julgamento, em Berlim, de Sushiman Tehlirian (Robinson Stevenin). Ele é inocentado, apesar de haver assassinado o turco Tallat Pasha (Francis Boulmé), que é acusado por Tehlirian de ordenar o assassinato de sua família e milhares de armênios. Filmado em branco e preto e rigoroso na reconstituição histórica, esse prólogo brilhante abre caminho para o impacto da ação de Tehlirian num grupo de jovens descendentes de armênios que, no começo dos anos 1980, decide aderir ao terrorismo.
Esta parte contemporânea, filmada em cores, se desenvolve entre Marselha, Paris e o Beirute, lugares onde o jovem Aram (Syrus Shahidi) se move quando participa de um atentado que mata o embaixador turco e, sem querer, deixa gravemente ferido o estudante de medicina Gilles Teissier (Grégoire Leprince-Ringuet). É nessa história, influenciada por um livro do jornalista espanhol José Antonio Gurriaran, que Guédiguian pede para o espectador se fixar.
Ele vai explorar a virada na percepção de Gilles, após o encontro com a mãe de Aram, a dona de casa Anouch (Ariane Ascaride), que lhe pede para conhecer o filho e perdoá-lo. Em alguns momentos, Uma História da Loucura parece ingênuo e didático, mas Guédiguian não arreda pé em seu desejo de encontrar uma saída justa para os armênios que não seja o derramamento de sangue.
(Fonte portal jconline.ne10.uol.com.br)